O INSS decidiu suspender por 60 dias o repasse de mensalidades a quatro associações de aposentados que concentram reclamações de cobrança indevida – ou seja, sem a autorização dos beneficiários. Juntas, elas concentram mais de 800 mil filiados. O órgão vai apurar se as entidades cometeram irregularidades na busca de novos filiados. A suspeita é que as associações estão usando ofertas de empréstimo consignado ou seguro de vida para camuflar a adesão ou até obrigar o segurado a se associar.
O INSS tem acordo de cooperação técnica com 17 associações de aposentados para permitir o desconto de mensalidades diretamente da folha de pagamento dos segurados. As entidades dizem prestar assistência jurídica, financeira e de saúde aos filiados – há descontos em redes de farmácias cobertura para exames médicos, serviços residenciais e auxílio-funeral, por exemplo. São repassados cerca de R$ 720 milhões ao ano por meio desses convênios.
As adesões, no entanto, nem sempre são feitas com a anuência do aposentado ou pensionista. Muitas vezes eles contratam algum serviço e, em meio aos documentos que precisam assinar, acabam autorizando o desconto sem perceber. O repasse pode chegar a 5% do benefício – para quem recebe um salário mínimo, são R$ 49,90 ao mês. Há ainda episódios em que a prestação de um serviço é condicionada à adesão a uma “entidade parceira”.
O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) instaurou em abril quatro inquéritos civis para apurar suspeitas de irregularidades das associações que agora tiveram o repasse suspenso pelo INSS. São elas: Associação Beneficente de Auxílio Mútuo ao Servidor Público (Abamsp), Associação Nacional de Aposentados e Pensionistas da Previdência (Anapps), Associação Brasileia de Aposentados, Pensionistas e Idosos (Asbapi) e Central Nacional dos Aposentados e Pensionistas (Centrape). Procuradas, as entidades dizem atuar contra fraudes.
Os procuradores ainda aguardam informações solicitadas aos envolvidos. Caso os golpes sejam atestados pelas investigações, os responsáveis podem ser acusados de estelionato, falsidade ideológica, falsidade material e até formação de quadrilha.
O Ministério Público Federal (MPF) também tem procedimentos abertos em pelo menos oito Estados para investigar as filiações a associações de aposentados. No ano passado, o próprio Conselho Nacional de Previdência (CNP), colegiado composto por integrantes do governo, notificou a Polícia Federal sobre casos semelhantes.
Só uma agência do INSS em São José dos Campos registra cerca de 300 pedidos mensais de fim do desconto dessas quatro associações, segundo o MP-SP. Há casos em que o aposentado é desligado de uma entidade, mas acaba, meses depois, descobrindo que virou filiado de outra.
O ofício acendeu a luz amarela no INSS, que fez um levantamento interno e descobriu que a Abamsp foi alvo de 6,1 mil queixas entre 2018 e 2019. No mesmo período, foram recebidas 5,4 mil reclamações da Asbapi, 4,3 mil da Centrape e 3,4 mil da Anapps. Apenas ntre 19 de fevereiro e 22 de março, houve 1.272 reclamações envolvendo nove entidades – 1.182 delas (ou 92,9%) tendo as quatro associações investigadas como alvo.
As quatro entidades investigadas já ficaram sem receber os repasses do mês de junho e terão 15 dias para se defender. Os beneficiários continuarão tendo os valores descontados, mas o dinheiro ficará sob tutela do INSS até a conclusão dos processos administrativos. Confirmadas as irregularidades, os beneficiários serão reembolsados, e os convênios, cancelados.
Sobre a decisão de suspender os repasses, o presidente do INSS, Renato Vieira, afirmou que o órgão não poderia se manter inerte diante de números tão significativos de reclamações de aposentados. “A partir de agora, o INSS vai demonstrar postura de maior intolerância com qualquer tipo de prática prejudicial aos aposentados, seja por parte de associações representativas de aposentados, seja por parte de instituições financeiras. Qualquer irregularidade será objeto de profunda investigação.”
Fonte: Terra