Cemitérios são locais de preservação da história e também de exibição da arte e da cultura de seu povo
Se você pensa que todos os cemitérios são iguais — compostos por lápides, nichos ou um ou outro mausoléu mais extravagante —, saiba que você está enganado.
Aliás, a arte tumular é muito famosa em várias partes do mundo e uma visita a cemitérios de vários pontos do mundo pode se revelar muito instrutiva e interessante.
Existem cemitérios muito famosos e visitados — como o La Recoleta, em Buenos Aires, Père Lachaise, em Paris, Hghgate, em Londres e Staglieno, em Gênova — que abrigam túmulos que fogem dos motivos religiosos convencionais, mostrando uma impressionante coleção de esculturas curiosas adornando os sepulcros e, em alguns casos, apavorando os visitantes.
Dê uma olhada na seleção de sepulturas inusitadas que existem por aí:
Charles Pigeon e de sua esposa no cemitério de Montparnasse – Paris.
Pigeon era negociante de lâmpadas Pombo e ficou famoso e rico. Depois de sua morte, ele continua a ser conhecido pelo túmulo da família, que ele encomendou em 1905 para armazenar até 18 membros. A escultura que o adorna causa uma certa má impressão, mas é muito bem feita.
Túmulo de William Thornton no cemitério St. James – Londres
Pianista clássico do inicio do século passado, morreu aos 35 anos, em 1918, de gripe espanhola. Foi sepultado no famoso cemitério de Highgate, que faz parte da lista dos denominados “Magnificient Seven” (Sete Magníficos), construídos na primeira metade do século XIX com o objetivo de solucionar a sobrelotação dos cemitérios paroquiais londrinos.
Highgate foi fundado em 1839 (a ala oeste) e é conhecido por seu aspecto sombrio e pelas sepulturas enfeitadas com anjos e cruzes.
Túmulo de Italino Lacomelli no cemitério de Staglieno – Gênova
Inaugurado em 1850, o Staglieno teve origem no mesmo programa lançado por Napoleão de descontinuar os enterros em igrejas ou nas imediações. O terreno cobre uma extensa área de mais de um quilómetro quadrado, integrando uma colina íngreme. Idealizado pelo arquiteto Carlo Barabino, atraiu os principais escultores italianos, que nele fizeram questão de deixar a sua marca. O tumulo de Italino é famoso porque a obra que o enfeita, de autoria de Adolph Luciarinni , é uma reprodução de sua morte. Ele foi assassinado por um louco enquanto brincava em um parque da cidade.
Túmulo de Aeffderson e Van Gorkum, em Roermond- Holanda
Em 1842 uma mulher da nobreza católica casou-se com um coronel da cavalaria holandesa. O fato desafiou a sociedade da época, mas as convenções não impediram o amor que durou 38 anos, com a morte dele.
Protestante, foi sepultado num tumulo no cemitério Roermond, que dividia os mortos de acordo com sua religião e os separava com um grande muro de tijolos.
Ela faleceu em 1888, mas como recusava-se ser separada do marido, deixou ordens por escrito que não queria ir para o tumulo da família católica, ficando com um próximo ao do coronel. Separados por um muro, os túmulos se erguem sobre ele, com duas mãos que se entrelaçam.
Túmulo de Georges Rodenbach no cemitério de Père Lachaise – Paris
O escritor Belga morreu em 1898 e sua sepultura foi adornada com uma escultura que mostra o próprio Rodenbach arromdando o tumulo e de lá saindo romanticamente com uma rosa na mão. A ação do tempo tornou a escultura em bronze com um aspecto esverdeado, que lhe confere um certo ar “Zumbi”.
Túmulo de Josep Soler Llaudet no cemitério de Poblenou – Barcelona
Esse industrial do ramo têxtil foi sepultado em 1930. A sepultura fica nos fundos do cemitério e atrai a atenção de muitos visitantes. Trata-se da personificação da morte dando boas-vindas para o recém chegado.
O cemitério do Poblenou foi o primeiro a ser construído fora da cidade amuralhada em Barcelona, no ano de 1775. Foi idealizado para solucionar os problemas de insalubridade que os enterramentos em fossas paroquiais causavam. Durante a invasão de Napoleão, o cemitério foi destruído. Em 1813, o arquiteto italiano Antonio Ginesi foi o responsável por reconstruir o cemitério, inspirando-se nos ideias da Revolução Francesa.
Túmulo de Rosália Lombardo, nas Catacumbas dos Capuccinos – Palermo
Essa criança italiana morreu de pneumonia, antes de completar 2 anos de idade. Seu pai, o oficial Mario Lombardo – inconformado com sua morte – pediu para que Alfredo Salafia, um notável embalsamador, a mumificasse. O corpo dela foi um dos últimos cadáveres a ser admitido nas Catacumbas dos Capuchinhos de Palermo, na Sicília, e encontra-se quase intacto até hoje.
As catacumbas datam de 1599, quando os capuchinhos o estabeleceram como lugar de última morada para os frades. O local ficou pequeno e os frades decidiram ampliar o cemitério escavando cavernas subterrâneas. Ao transportar os corpos antigos para as novas galerias, descobriram que muitos estavam mumificados, num processo natural. A partir de então, a alta burguesia passou a escolher o local para ser “sepultada”. As catacumbas viraram museu em 1950 e estima-se que existam mais de 8 mil múmias no local.
Túmulo de Victor Noir, no cemitério do Père Lachaise – Paris
Victor era o nome ficticio do jornalista Yvan Salmon, que foi morto a tiros em 1870 um dia antes de seu casamento. Tristemente ele é mais famoso por sua morte – por seu tumulo na verdade – que por sua vida. Em sua lápide repousa uma estátua de bronze. Devido ao estilo naturalista da escultura de autoria de Jules Dalou, que representa o morto com cabelos despenteados, boca entreaberta e sangue nos lábios, a sensação é que ele despertará a qualquer momento.
Há uma lenda que diz que quem colocar uma flor em sua cartola e depois beijar a estátua nos lábios, terá sua fertilidade ampliada. O gesto traria uma vida sexual bem-aventurada.
Tumulo de Arnold Savage Landor, no cemitério “não católico” – Florença
O Túmulo é famoso pela estátua de sua mãe, sofrendo por sua morte. Arnold é filho de Walter Savage Landor, escritor e pintor, morto em 1864 e que também está sepultado no mesmo local.
É um dos mais visitados do cemitério “não católico” ou Protestante ou ainda dos Ingleses, como é conhecido. Datado de 1827, possui cerca de 4000 túmulos, quase todos estrangeiros: americanos, ingleses, alemães, escandinavos, chineses, russos e árabes. Lá estão sepultadas Florence Nightingale, pioneira no trabalho de atendimento a feridos de Guerra e madrinha dos enfermeiros, e Elizabeth Barrett Browning, poetisa inglesa da época vitoriana.
Tumulo de Caroline Tucker, no cemitério de Highgate – Londres
Caroline morreu em 1994 e sua história não é cheia de mistérios ou lendas. Foi esposa, mãe e avó, amada pela família. É mais famosa pela escultura que enfeita seu túmulo no famoso E tradicional cemitério de Highgate, em Londres.
Tumulo de Fernand Arbelot, no cemitério Père Lachaise – Paris
O músico, ator e arquiteto, Fernand Arbelot morreu em 1942, durante a ocupação nazista na França e, portanto, pouco se sabe de fato sobre o que aconteceu. Seu túmulo foi adornado com a obra do escultor belga, Adolphe Wansart, apenas dois anos depois de sua morte. Um epitáfio diz: “Eles ficaram maravilhados com a bela jornada que os levou ao fim da vida”.
Dizem que a escultura retrata o desejo de Arbelot de contemplar na eternidade o belo rosto de sua esposa, que ele teria matado antes de suicidar-se.
O que significam as imagens nos túmulos
Você já reparou que algumas imagens tumulares são recorrentes? Na verdade trata-se de uma convenção cultural. Confira o que significam as mais recorrentes figuras vistas nos cemitérios tradicionais.
- Caveira alada
A imagem de um crânio com asas foi bastante popular nos século 17 e 18 e representa a fugacidade da vida e o “voo” da alma pela vida eterna.
- Ampulheta com asas
Semelhante à figura acima, a ampulheta alada também simboliza que a vida passa “voando”.
- Aperto de mãos
Bastante comum em túmulos de casais, a imagem de um aperto de mãos representa a situação em que a primeira pessoa morre, mas deixa seu parceiro “para trás”. Também pode simbolizar que ambos estão juntos na vida eterna.
- Pomba
A pomba normalmente é encontrada em túmulos de mulheres que faleceram muito jovens, já que é o símbolo da paz e da pureza. A imagem costuma ser posicionada como se estivesse pronta para voar aos céus.
- Tocha invertida
A imagem de uma tocha invertida em algum túmulo simboliza que a alma da pessoa falecida ainda está flamejando na vida eterna.
- Tronco cortado
Esse tipo de representação normalmente era usado para simbolizar a vida das pessoas que foram mortas repentinamente.
- Trigo
Já o trigo simboliza uma vida longa, que foi ceifada pelo Criador na hora certa.
- Ovelha
A representação da ovelha aparece normalmente em túmulos de crianças, justamente por fazer referência a Jesus, o Cordeiro de Deus.
- Livro aberto
A imagem de um livro aberto pode ter vários significados: tanto pode ser o “livro da vida” quanto a própria Bíblia Sagrada. Também pode simbolizar que a pessoa está aberta a Deus ou simplesmente que era fã de literatura.
- Urna coberta
Em cemitérios vitorianos, as urnas cobertas são extremamente comuns. É o símbolo da separação entre os vivos e os mortos, além de representar a proteção da alma.
- Portões abertos
A imagem de portões abertos em um túmulo representa a entrada do Céu.
Revista Diretor Funerário n° 262 – fev-2018