No Equador, uma nação que foi duramente atingida pela Covid-19, hospitais estão em estado de caos e famílias estão tendo que procurar os corpos de parentes que acreditam estarem mortos.
Mas em meio à enxurrada de notícias negativas no país latino-americano, ganhou manchetes o caso de uma mulher declarada morta, mas que, posteriormente, foi encontrada viva.
A família de Alba Maruri, 74 anos, foi notificada de sua morte em março e recebeu até uma urna com suas supostas cinzas.
Mas Maruri ficara em um coma de três semanas no hospital; quando acordou, pediu aos médicos que ligassem para sua irmã.
Corpos – Alba Maruri havia sido internada em um hospital na cidade de Guayaquil, epicentro do surto de Covid-19 no Equador.
Lá, as autoridades estavam com sérios problemas para dar conta da coleta de corpos das pessoas que morriam em casa.
Com uma população de 17 milhões e sendo um país muito menor do que seus vizinhos, o Equador foi proporcionalmente mais afetado pela Covid-19, registrando mais de 22 mil casos e quase 600 mortes.
Inés Salinas e seu marido, Filadelfio, morreram no dia 30 de março.
A família disse à BBC News Mundo que eles tiveram de esperar quatro dias antes que as autoridades finalmente viessem recolher os corpos.
Eles tiveram que embrulhá-los em plástico enquanto esperavam, diz Bertha, irmã de Inés. Agora, ela quer saber o que aconteceu com os corpos depois que eles foram retirados de casa.
“Nos disseram que tínhamos que esperar, e que eles seriam enterrados a qualquer momento e eles [as autoridades] nos avisariam”, disse ela.
Ela não tem notícias das autoridades desde então.
“Eu já fiz uma reclamação formal. Não sabemos o que fazer.”
Sistema em colapso
A situação da família Salinas não é única: dezenas de pessoas estão entrando em contato com hospitais, necrotérios e policiais procurando os corpos de seus entes queridos.
O alto número de mortes em Guayaquil causou o colapso do sistema de saúde da cidade em março.
Os hospitais enviaram os corpos para armazéns fora de uso, onde estes começaram a se decompor. Sem alternativas, famílias tiveram de ir até lá para identificar o corpo que estavam procurando.
Darío Figueroa é um dos parentes que conseguiram encontrar o corpo de sua mãe, Santa Marianita Barzola Martillo. O cadáver havia sido mantido no necrotério ao lado de pilhas de corpos.
Ele disse à BBC Mundo: “Estávamos esperando havia dias no hospital e nos reunimos para pressionar. Um dia, convencemos os guardas a nos deixar entrar no necrotério. Colocamos sacos de lixo em nossas cabeças, outros trouxeram máscaras e luvas. O fedor era insuportável. Que indignação ao ver o número de mortos, eles foram empilhados uns sobre os outros em sacos de corpos.”
‘Milagre’ – Em meio ao caos, muitos no Equador ficaram surpresos com a notícia sobre a mulher que ainda estava viva.
A família de Alba Maruri ficou muito feliz, mas ainda não está claro de quem são as cinzas que têm em casa.
Em 27 de março, a família foi informada de que Maruri havia morrido, depois de ter sido internada no hospital com febre alta e complicações respiratórias.
Os familiares chegaram a ser levados para ver o cadáver no necrotério do hospital, mas tiveram que ficar à distância como precaução, para impedir a propagação do vírus.
“Eu estava com medo de ver o rosto dela”, disse o sobrinho de Maruri, Jaime Morla, à agência AFP. “Eu estava a um metro e meio de distância. Ela tinha o mesmo cabelo, o mesmo tom de pele.”
O corpo foi levado e cremado, e as cinzas foram enviadas para a família.
Na realidade, Maruri estava inconsciente e acordou três semanas depois, chamando por sua irmã.
“É um milagre. Por quase um mês, pensamos que ela estava morta”, disse sua irmã, Aura. “E nós temos as cinzas de outra pessoa.”
Não temos onde chorar
O hospital pediu desculpas pela confusão.
A família diz que quer que as autoridades os compensem – e reembolsem o custo da cremação.
Tiveram de comprar um colchão novo para Alba, pois sua família jogara fora o antigo.
Mas enquanto os Maruri suspiram de alívio, muitas outras famílias continuam a procurar os corpos de seus entes queridos desaparecidos.
Por causa do caos e do medo do contágio, eles foram privados de se despedir daqueles que faleceram.
Mercedes, filha mais nova das Salinas, diz que todos os membros da família contribuíram para conseguir uma tumba para os pais descansarem.
“Mas como podemos fazer isso, se eles não nos dão os corpos?”, diz ela.
“É horrível não saber onde minha mãe e meu pai estão. É difícil não ter nenhum lugar para chorar.”
Fonte: G1