Segundo pesquisa, 30% dos entrevistados dizem já ter começado a fazer planejamento para fim da vida; setor, porém, ainda engatinha com negócios que ajudam em burocracia
A morte é considerada um tabu para 7 em cada 10 brasileiros e, em meio a uma pandemia que já deixa quase 30 mil mortos apenas no Brasil, falar do assunto se torna ainda mais controverso. Ainda assim, o momento de crise causado pelo novo coronavírus trouxe mais reflexões sobre o tema: 70% dos entrevistados com mais de 60 anos afirmam que estão refletindo mais sobre a finitude da vida e 70% daqueles acima de 45 anos acham importante organizar testamento e plano funeral. Mas, como reflexo do tabu, apenas 30% já começaram de fato esse planejamento.
Essas são as principais conclusões a que chega o levantamento Plano de Vida & Legado, conduzido pela agetech (startup do setor de longevidade) Janno em parceria com a empresa de pesquisa MindMiners. O estudo, que começou a ser feito em fevereiro e foi atualizado durante o isolamento social, entrevistou 1.053 brasileiros com mais de 45 anos de todas as regiões do País.
A pesquisa aponta um caminho para negócios que podem ajudar a desembaraçar a burocracia num momento tão doloroso para as famílias, em um setor que ainda é mal atendido no País.
Layla Vallias, que fundou a Janno em novembro do ano passado ao lado do engenheiro Uri Levin, diz acreditar que num momento desses seria pior não falar sobre a morte. “A pandemia trouxe a consciência de que a gente é finito. A partir disso, a gente começa a refletir sobre a nossa finitude e como se preparar para ela”, comenta.
De acordo com estudo do Sindicato dos Cemitérios e Crematórios (Sincep), 87% dos brasileiros não se sentem preparados para lidar com a morte. Ainda assim, com todo o tabu que cerca o tema, a pesquisa da Janno e da MindMiners revela que 70% dos brasileiros com mais de 45 anos já conversaram sobre seus ritos funerários com familiares e amigos.
“Tem toda uma discussão sobre uma morte digna: como você quer ser cuidado, o que é importante pra você – e para isso é preciso refletir sobre o assunto”, diz Layla, que lida com o tema longevidade e economia prateada também na Hype60+, consultoria focada no público com mais de 60 anos.
Negócios no mercado da finitude
O levantamento mostra que, da vontade à ação, existe um vácuo onde pode estar a oportunidade de negócio: 77% dos entrevistados conhecem os seguros de vida, mas somente 35% o possuem, e entre aqueles que buscam informações para planejar os ritos do fim da vida 34% recorrem a familiares, 25% a profissionais da área, 25% a internet e somente 8% a empresas especializadas.
Na Associação Brasileira de Startups (ABStartups), as empresas do mercado da longevidade e da finitude (que lá fora são chamadas de agetech) são de um nicho tão embrionário que a subdivisão ainda não existe na entidade. Pertencem ao grupo das healthtechs, um conceito geral de startups de saúde, que hoje somam 450 na ABStartups.
Com base na identificação de carências na área, Layla e Levin desenharam a Janno como uma espécie de cofre digital, onde pode-se guardar documentos e informações pertinentes caso a pessoa venha a falecer. O objetivo é facilitar as burocracias a serem enfrentadas pelos familiares. No serviço, as informações poderiam ser acessadas digitalmente e a empresa cuida de conceder o acesso às pessoas indicadas pelo contratante.
“O processo de envelhecimento é algo bastante caro e custoso, mas percebemos que existia a possibilidade de redução de gastos nessa fase da vida. Um dos gastos mais relevantes que se tem na vida de uma pessoa é quando ela não está mais aqui”, afirma Uri.
Também fundada em 2019, a Ziigo funciona com uma plataforma de venda de jazigos e contratação de serviço funeral de forma preventiva. Formada por seis sócios, alguns da área de cemitérios e outros de seguros, a empresa criou planos que cobrem, para a família, todas as despesas que envolvem o momento da morte. Assim, cuida de sepultamento ou cremação, traslado, velório, coroa de flores e funeral.
Durante a pandemia, a empresa passou a ter uma procura maior para a compra do serviço funeral, por meios digitais, principalmente nos lugares mais afetados pelo novo coronavírus, como São Paulo, Rio de Janeiro e Manaus.
Vicente Conte, um dos sócios, conta que as inadimplências caíram e que aqueles que estavam sem pagar pelo serviço voltaram à ativa. “Muitos procuraram com uma consciência maior. O assunto da morte bateu na consciência das pessoas e a prevenção entrou no radar.”
Fonte: Ana Barbosa para o Estado de São Paulo