Sensibilidade 

Todos os protocolos, planos de gerenciamento e  contingências, elaborados tanto pelo poder público como pelas entidades funerárias são oportunos, necessários e corretos no seu propósito, contudo, todos eles partem de um princípio, que é uma situação emergencial calculada com bases que não são precisas nem totalmente conhecidas,  de um cenário que ainda não estamos vivendo em todo território nacional, salvo em algumas localidades onde houve uma grande dessiminação do covid-19. Mas, mesmo assim, estamos aplicando quase que na plenitude, antecipadamente, praticamente todas as normas, mudanças e sanções  estudadas. Como teste ótimo, mas temos que rever esta situação, uma vez que, estamos infringindo a universo enorme de famílias uma dor desnecessária. É preciso que todas famílias, indistintamente, tenham direito de finalizar o luto com uma cerimônia funerária digna.

Não existe hoje nenhuma razão consistente que justifique o sepultamento direto das vítimas de covid-19 ou dos suspeitos dela, nem do ponto de vista de saúde pública, nem do ponto de vista técnico operacional do setor funerário, aliás, o sepultamento direto causa um estrangulamento nos cemitérios, o ideal é que os corpos sejam levados para eles de forma ordenada e sequencial, de tal maneira que possibilite os sepultamentos sem os tumultos e aglomerações que os coletivamente tem causado.

Naquilo que cabe a saúde pública, que tem que ser prioridade, pode-se afirmar que não existe a menor possibilidade de um corpo, desde que observado protocolos no seu manuseio, bem como, o acondicionado do mesmo, em dois invólucros e depois em uma urna (todos selados e lacrados), de contaminarem quem quer que seja, durante todo trajeto que fizer ou durante uma cerimônia funerária.

Agora, incalculáveis são os danos psicológicos, que serão causados a milhares de pessoas que estão sendo impedidas de viverem e de finalizarem o luto. Estas tem levado seus familiares ao hospital, lá eles são colocados em isolamento, muitas vezes impedidos de receberem visitas, falecem, são removidos diretamente ao cemitério, sem direito a um mínimo de dignidade. Mesmo para aqueles que falecem, os rituais funerários são essenciais, é por meio deles que seus espíritos começam a ter consciência de sua nova condição. Já para as famílias, a situação que estão lhes sendo impostas é desumana, o sentimento que devem sentir é o equivalente ao de se levar um filho na escola e não voltar buscar nunca mais, ou ao de perder um ente querido em um naufrágio e ficar na praia esperando o corpo aparecer, por toda vida. É um vazio inexplicável.

A ABREDIF solicita que as autoridades revisem as aplicações de normas impostas ao setor funerário, de tal forma que as mesmas sejam aplicadas no tempo certo, conforme uma necessidade real. Que antes de tomarem novas medidas, que consultem o setor, conheçam nossa matriz, as opções, somos o BRASIL, não devemos nem podemos ficar copiando ações de países com culturas absolutamente diferentes das nossas. Respeitar a vida é dever de todos nós, não podemos perder a sensibilidade em nome de uma sobrevivência ameaçada, porque viver sem sentimentos, sem poder demonstrar o amor,  não é viver.

Ariano Suassuna declama “Quem foi temperar o choro e acabou salgando o pranto?”

Que não sejamos nós.

 

Lourival Panhozzi

Diretor Funerário 

Pres.ABREDIF/SEFESP