...”um amigo me chamou para cuidar da dor dele; guardei a minha no bolso e fui”…….Fernando de Abreu
A morte é a única coisa que só se faz uma vez na vida, morrer bem é fazer bem feito este momento, é dar sentido, entender a própria existência e não temer o depois. Quando se compreende o antes e o aceita o resultado não é apenas uma consequência, é sim a resposta e a elucidação do mistério de viver que inexoravelmente termina em morte. Para Morrer bem não é preciso querer nem desejar morrer, mas é necessário recepciona-la no momento oportuno com altivez de espirito.
Segundo uma renomada medica geriatra, Dra. Ana Cláudia Quintana Arantes, que foi a fonte inspiradora deste texto, “a morte é um dia que vale a pena viver”, quando ouvi esta frase passei um longo período sem conseguir parar de refletir a respeito do papel do Diretor Funerário dentro do contexto morte, trata-la simplesmente como o momento em que se realiza uma venda é um desperdício absurdo de se conhecer, de aprender lições e experiências que não se pode encontrar em nenhum outro lugar do planeta pois só se manifestam no momento mais verdadeiro da humanidade, o momento da morte. A inadmissibilidade de se aceitar que o papel do funerário é vender urnas se comprova pelo fato de que se assim fosse a mesma seria vendida em supermercado, aliás, esta experiência já foi vivida nos E.U.A e foi um fracasso. Uma família quando perde um ente querido não precisa de urna, em algumas culturas ela nem é utilizada, ela precisa de alguém que a ouça e entenda suas necessidades, que tenha experiência e profissionalismo para lhe auxiliar a tomar as medidas necessárias, respeitando sua individualidade e sentimento.
O período de tempo que o funerário passa com uma família logo após esta ser comunicada do evento morte é extremamente significativo para ambos, uma fusão de emoções se manifesta, o nível de paz, medo, estresse e culpa se elevam ao máximo e não apenas os atos como também todo e qualquer gesto ou palavra proferida pelo diretor Funerário serão determinantes no julgamento que a família fará e na lembrança que guardara, está ela neste momento revendo sua consciência existencial e valores. É dentro deste ambiente que o Diretor Funerário tem que encontrar espaço para expressar sua vocação, são minutos intermináveis para família, para ela o tempo congelou e só o calor de um atendimento afetuoso, respeitoso e profissional pode dignificar a ação do funerário.
Ninguém espera que o Diretor Funerário tire a dor da família com uma palavra mágica, a dor do luto não pode ser tirada por ninguém, mas quando se oferece ajuda sincera, em um ambiente onde a solidão assola, este ato é recebido como uma esperança e um alivio a carga de decisões necessárias e obrigatórias em decorrência de um falecimento. Se o funerário conseguir demonstrar que pode cuidar daquele momento com respeito e resolutividade a família irá perceber e responder com a generosidade do reconhecimento, e acreditem, não existe melhor recompensa.
No Brasil 80% das pessoas que morrem tem a morte anunciada, sabem com relativa precisão a época em que vão morrer, são portadoras de doenças crônicas terminais e não só a ciência como também o instinto lhes assopram aos ouvidos da alma que o momento está próximo, uns ouvem, outros se fazem de surdo na esperança de não serem visto, mas a morte mesmo sendo cega tem como aliada o tempo, e este é avassalador, no final acaba por encontrar a todos.
Todos sabem que não se pode escolher o início de nossa história, mas como se portar no final é prerrogativa de cada um.
Morrer de bem é romper a linha de chegada no final da vida com dignidade e coragem, já a morte é um livro que acaba de ser escrito, quando ele termina morrer não é uma escolha. O corpo sofre mais durante a vida que no momento da morte, o sofrimento que algumas vezes se experimenta no instante da morte são um gozo para o espirito, que vê chegar ao fim seu exilio.
“Não é da morte que temos medo, mas de pensar nela, pois a inexorável despe-nos de nossos bens para nos vestir das nossas obras.”
(Sêneca)
lourival panhozzi
Diretor Funerário
Aprendendo a morrer bem